Os últimos 10 anos foram marcados por transformações profundas no diagnóstico e tratamento do câncer de mama, resultando em ganhos expressivos de sobrevida, redução de toxicidade e maior personalização terapêutica. A oncologia mamária avançou de forma integrada, com progresso consistente na cirurgia, radioterapia, terapias sistêmicas, biologia molecular e manejo de metástases. A seguir, destacam-se os avanços mais relevantes deste período.
1. Personalização terapêutica e medicina de precisão
A incorporação de assinaturas genômicas — como OncotypeDX e MammaPrint — mudou o paradigma da indicação de quimioterapia, nos tumores luminais. Esses testes permitiram evitar quimioterapia em milhares de pacientes com baixo risco biológico, marcando o início da adequação terapêutica baseada em risco individual.
2. Evolução no tratamento do HER2+
A terapia-alvo para HER2+ passou de regimes únicos para regimes duplos com combinações altamente eficazes e mais recentemente com anticorpos conjugados. De trastuzumabe e pertuzumabe, avançamos para agentes como T-DM1 e, mais recentemente, T-DXd, que ampliaram sobrevida tanto no cenário metastático (DB09) e melhoram os desfechos na adjuvancia (DB05 e DB11). A ideia binária de HER2 positivo vs negativo foi superada com o conceito de HER2-low, expandindo o benefício terapêutico (DB04).
3. Imunoterapia para TNBC
A imunoterapia consolidou-se como marco paradigmático no carcinoma triplo negativo (KEYNOTE 522). A combinação de pembrolizumabe com quimioterapia elevou taxas de resposta patológica completa e sobrevida, tanto no neoadjuvante quanto no metastático, alterando o curso da doença mais agressiva da mama.
4. Terapias endócrinas avançadas
A última década assistiu:
• à aprovação dos inibidores de CDK4/6 no cenário metastático e, mais recentemente, no adjuvante para tumores luminais de alto risco (MonarchE e Natalee);
• ao surgimento dos SERDs orais (elacestrante e imlunestrante), e o desenvolvimento de novos agentes para tumores ESR1 mutados; no ultimo san antonio, um serd reduziu em 1/3 o risco de eventos no cenário adjuvante ! (Giredestrant)
• à estratégia de troca terapêutica guiada por mutação, como demonstrado em SERENA-6 (camizestranto), abrindo possibilidades de tratamento adaptativo.
5. Progresso para pacientes com mutações hereditárias
A aprovação de olaparibe e consolidou o papel dos inibidores de PARP em pacientes com mutações BRCA, no cenário metastático e adjuvante. O entendimento sobre outros genes expandiu estratégias preventivas e de vigilância.
6. Menos quimioterapia, mais racionalização
Ensaios como RxPONDER e Mammaprint suportaram a omissão de quimioterapia em mulheres com linfonodo positivo e baixo risco genômico, reforçando o conceito de desescalonamento com segurança.
7. Avanços cirúrgicos
Nos últimos 10 anos, a cirurgia também mudou profundamente:
• disseminação das técnicas oncoplásticas, permitindo melhores resultados estéticos sem comprometer margens;
• ampliação da preservação cutânea e do complexo aréolo-mamilar em casos selecionados;
• preservação da axila após quimioterapia neoadjuvante, mesmo com axila inicialmente positiva (Z1071 e Sentina);
• queda progressiva da indicação de esvaziamento axilar em sentinela positivo na cirurgia primaria (Z0011, AMAROS e outros); omissão do linfonodo sentinela em casos selecionados (SOUND/INSEMA)
• reconstrução imediata mais segura com expansores e próteses com técnicas mais preservadoras e avançadas;
• maior uso de mastectomia profilática orientada por risco genético.
8. Radioterapia moderna
A radioterapia evoluiu com:
• hipofracionamento seguro e eficaz;
• radioterapia parcial para tumores selecionados;
• técnicas mais precisas (IMRT, por exemplo) com menor toxicidade cardíaca e pulmonar;
• omissão de radioterapia em idosos de baixo risco (LUMINA, PRIME II) e quando ha resposta nodal para quimioterapia (B51)
9. Manejo da doença metastática
Uma revolução ocorreu na metástase:
• ADCs ampliaram sobrevida e resposta em nível sem precedentes em HER2+;
• imunoterapia e PARP fizeram o mesmo em TNBC e BRCA;
• avanços específicos em metástases cerebrais — ADCs e TKIs — ofereceram controle intracraniano real, antes improvável.
10. Novos conceitos biológicos
• HER2-low
• ESR1 mutado
• Carga mutacional dos tumores
• Microambiente imunológico
• ctDNA para mínima doença residual
Esses conceitos consolidam a transição da oncologia para biologia tumoral personalizada.
Conclusão
Grandes avanços foram obtidos no tratamento locorregional e sistêmico em mulheres com câncer de mama. Entretanto, ainda há um longo caminho a se percorrer: garantir acesso a todas estas tecnologias para pessoas com acesso limitado a recursos de saúde, como acontece no Brasil, será o grande desafio nos próximos anos, bem como buscar soluções para casos que ainda recorrem a despeito destes avanços.


